PSD, PS, Bloco e PCP não alteram uma vírgula em relação ao fim do limite para a angariação de fundos e forçam confronto com Presidente da República, que vetou alterações ao financiamento dos partidos.
Os partidos que aprovaram a alteração à lei do financiamento partidário — PSD, PS, Bloco e PCP — não alteram uma vírgula em relação ao fim do limite para a angariação de fundos. Esse foi precisamente um dos pontos levantados por Marcelo Rebelo de Sousa quando vetou o diploma, mas nem assim os quatro partidos decidiram recuar no braço-de-ferro com Belém. Apenas CDS e PAN mantêm esses limites nas propostas de alteração que foram entregues esta quinta-feira. Marcelo Rebelo de Sousa tinha apontado o fim do teto para a angariação de fundos como uma das duas disposições especialmente “relevantes”.
A outra tinha a ver com o reembolso do IVA. Em relação a este aspeto, todos os partidos apresentaram alterações ao diploma vetado, à exceção do PCP, que desde o início se manifestou contra qualquer alteração ao decreto aprovado em dezembro de forma polémica. PSD, CDS e PAN defendem que o reembolso do IVA se mantenha como está na atual legislação, mas o Bloco de Esquerda recua e tenta clarificar o que pretendia. O PS insiste na redação controversa do diploma, esclarecendo apenas que não há reembolso do IVA em relação às despesas realizadas em campanhas eleitorais.
As últimas propostas deram entrada no Parlamento esta quinta-feira, data final para a entrega de alterações ao diploma vetado por Marcelo Rebelo de Sousa. As várias iniciativas serão discutidas e votadas esta sexta-feira de manhã na Assembleia da República. Em 2 de janeiro, quando vetou a lei, o Presidente da República foi claro:
O Decreto aprovado pela Assembleia da República juntou à matéria de fiscalização das finanças partidárias, outras disposições avulsas, duas das quais especialmente relevantes, por dizerem respeito ao modo de financiamento e por representarem, no seu todo, uma mudança significativa no regime em vigor: o fim de qualquer limite global ao financiamento privado e, em simultâneo, a não redução do financiamento público, traduzida no regime de isenção do IVA. Tudo numa linha de abertura à subida das receitas, e, portanto, das despesas dos partidos.”
Ou seja, traduzindo o texto, Marcelo Rebelo de Sousa dá a entender que, com o fim dos limites globais ao financiamento privado, devia haver uma redução do financiamento público e não uma isenção de IVA — o que significaria um aumento de receitas dos partidos por duas vias em simultâneo. Resta saber se, para Belém aceitar o fim dos tetos às angariações de fundos, basta que não se mexa no IVA.
Angariação de fundos. Partidos não desistem do fim do tecto máximo
Se o diploma for aprovado (e depois promulgado por Marcelo Rebelo de Sousa), os partidos políticos não terão qualquer limite para a angariação de fundos que podem recolher num ano. Até ao momento, o teto máximo é de 631.980 euros (correspondentes a 1500 vezes o Indexante de Apoios Sociais, que em 2017 estava nos 421,32 euros). Sem tecto máximo, essa angariação dependerá sempre da capacidade dos partidos: enquanto quiserem realizar festas como a do Avante! ou do Chão da Lagoa, por exemplo, estão livres de fazê-lo. Sem restrições.
Não confundir as angariações de fundos com os donativos pessoais, que é o valor que cada pessoa pode dar a um partido. Há um limite por donativo individual, mas não há um teto global para o conjunto dos donativos. A outra diferença é que as angariações de fundos pressupõem a diferença entre uma receita e uma despesa.
Esta nova realidade pode representar a generalização do financiamento dos partidos com malas de dinheiro e fundos de origem duvidosa. Luís de Sousa, antigo presidente da TIAC – Transparência e Integridade, era claro aqui em declarações ao Observador: “É um saco sem fundo, pode ser tudo e mais alguma coisa. Não havendo limites à angariação de fundos isto permite todo o tipo de manobras de opacidade, como a introdução de financiamentos de origem duvidosa ou malas de dinheiro reportadas como angariações de fundos”.
Recorde-se que, ao contrário do que foi sendo referido por alguns responsáveis políticos, o Tribunal Constitucional não sugeriu aos partidos que acabassem com os limites para a angariação de fundos pelos partidos. Manuel da Costa Andrade, presidente do Constitucional, pediu aos partidos que encontrassem uma forma de melhorar a fiscalização destas atividades. No entanto, mesmo perante as recomendações do Palácio Ratton, os deputados — menos os do CDS e o do PAN — decidiram acabar de vez com o teto imposto à angariação de fundos.
Fonte: Observador